Crítica | Emilia Pérez - Ao evitar um mergulho mais profundo nas questões que aborda, a obra acaba sacrificando sua força em favor de uma narrativa visualmente chamativa, mas incapaz de sustentar o peso de seus próprios temas.
Divulgação | Paris Filmes |
Título | Emília Pérez (Título original) |
---|---|
Ano produção | 2023 |
Dirigido por | Jacques Audiard |
Estreia | 06 de fevereiro de 2025 (Brasil) |
Duração | 130 Minutos |
Classificação | 16 - Não recomendado para menores de 16 anos |
Gênero | |
País de Origem | França e Estados Unidos |
Sinopse
O longa acompanha Rita (Zoe Saldaña), uma advogada de um grande escritório que liberta criminosos levados à justiça. Certo dia, ela recebe uma inesperada proposta: o líder de um cartel, Manitas (Karla Sofía Gascón), a contrata para ajudá-lo a se retirar de seu negócio e realizar um plano que vem preparando secretamente há anos: tornar-se a mulher que ele sempre sonhou ser. A trama é livremente adaptada do romance ‘‘Ecoute’’, de Boris Razon. O elenco ainda conta com Selena Gomez, Adriana Paz e Edgar Ramírez.
• Por Alisson Santos
• Avaliação - 5/10
No filme "Emilia Pérez", Jacques Audiard explora questões sobre violência, a essência do feminino e a autonomia nas escolhas, tudo embalado em um musical chato que também funciona como um melodrama sensível. A obra examina como a cultura aborda temas como diferença, desejo e esperança, utilizando como pano de fundo um cartel de drogas, uma cirurgia de redesignação sexual e a morte. Sem dúvida, é um projeto ousado, algo que Audiard não esconde. O filme é, em grande parte, um experimento ambicioso, que tenta equilibrar provocação e intimismo.
No entanto, há um problema central que compromete o resultado: a incapacidade do diretor de integrar de forma coerente os diversos elementos que utiliza. Apesar de "Emilia Pérez" ser peculiar e abordar pontos de vista distintos, Audiard deixa claro que o realismo não é sua prioridade. Desde as primeiras cenas, fica evidente que o objetivo é criar uma fantasia grotesca e dolorosa, mas também honesta e direta, projetada para provocar alguma reação no espectador, seja empatia pelos personagens ou reflexão sobre os conflitos que enfrentam.
Nesse sentido, o filme parece alcançar sua proposta inicial: trazer à tona debates complexos em um cenário que incita discussão e confronto. A narrativa, centrada em um traficante de drogas que decide abraçar sua identidade de gênero, é corajosa. Ainda mais quando o diretor entrelaça temas como feminilidade, amor, paixão e perdão. A trama busca explorar essas dimensões com profundidade, criando um espetáculo que alterna entre o riso e o choro. Contudo, em certo ponto, a ambição do filme ultrapassa sua execução.
Divulgação | Paris Filmes |
O universo de "Emilia Pérez" exige um olhar mais informado sobre a cultura abordada no longa. A violência no México, tema central, é complexa demais para ser simplificada ou suavizada em favor de uma narrativa mais palatável. Essa realidade brutal, que marca gerações e regiões inteiras, é tratada de forma superficial, perdendo a oportunidade de oferecer um olhar mais autêntico.
O diretor opta por construir uma fantasia exuberante, mais preocupada em emocionar do que em refletir com profundidade sobre o cenário que retrata. Com isso, o filme se transforma em um espetáculo vibrante, mas que carece de bases sólidas para sustentar algo mais profundo. A trajetória de Juan “Manitas” Del Monte (interpretado por Karla Sofia Gascón), que encontra redenção e um propósito ao assumir sua identidade, possui um tom utópico que sublinha a busca espiritual como um tema central. Ainda assim, o impacto dessa mensagem se perde em meio a um cenário caricatural que não faz jus à complexidade da realidade retratada.
O México de "Emilia Pérez" é construído a partir de clichês e uma visão superficial da cultura latina. Embora a obra não tenha a obrigação de ser um retrato documental do tráfico de drogas e suas consequências, a forma como ignora a gravidade do tema em favor de uma estética glamorosa enfraquece sua mensagem. Em muitos momentos, o filme prioriza o espetáculo e o humor, deixando de lado uma abordagem mais crítica e reflexiva. Ainda mais grave é o fato de o filme ter utilizado inteligência artificial para aprimorar o sotaque espanhol de algumas pessoas envolvidas na produção, em vez de contratar mais profissionais nativos do país.
Divulgação | Paris Filmes |
Conforme a história avança, torna-se evidente que a narrativa precisa de mais consistência para sustentar sua premissa. A mensagem de autodescoberta e redenção de Emilia, que encontra propósito ao tentar reparar os danos causados pela violência, requer um entendimento mais profundo do impacto desse cenário. No entanto, o filme evita confrontar essa realidade de forma significativa, optando por soluções artificiais que não dão conta da densidade do tema.
No final, "Emilia Pérez" tenta mesclar emoção, fantasia e crítica social, mas se perde em sua abordagem simplista. Ao evitar um mergulho mais profundo nas questões que aborda, a obra acaba sacrificando sua força em favor de uma narrativa visualmente chamativa, mas incapaz de sustentar o peso de seus próprios temas.
"Emilia Pérez" estreia em 6 de fevereiro nos cinemas nacionais.
Comentários
Postar um comentário